22 dezembro 2008

Deu na Revista Surf Portugal

O Mundo de Wavetoon
Todas as comunidades precisam dos seus mitos, narrativas simbólicas que dão um sentido à existência de quem delas faz parte. Quanto mais simples, elementares e partilháveis por todos, mais eficazes são os mitos, ao mesmo tempo que mais resistente se torna a comunidade. Fernando Pessoa, aliás, resumiu bem a importância do mito numa frase bem conhecida da Mensagem: “o mito é o nada que é tudo”. O surf não é excepção. Tem os seus mitos, por todos partilhados, independentemente da idade, do tempo de surf, do sítio onde surfam e, não menos relevante, da origem social. Se existe uma comunidade de surfistas é porque há algo que nos une para além da experiência tangível de deslizar nas ondas. E o que nos une é aparentemente uma mão-cheia de nadas, que, para nós, é, no entanto, de facto, tudo.Experimentem explicar a um não-surfista o mundo para o qual somos projectados quando pensamos em pranchas em cima dos carros e na descoberta de um point-break perfeito com ondas que quebram alinhadas, sopradas por um vento ligeiro, sem ninguém dentro de água. Para nós isto é tudo. Uma realidade com um sentido imediato e que, além do mais, é apreensível por todos. Para um não-surfista, estou certo, é um nada.Lembrei-me disto da primeira vez que conheci Wavetoon. Wavetoon que foi, primeiro, um site na net, para depois se tornar num livro de BD, à imagem das pequenas “histórias de quadradinhos” que inundaram as nossas infâncias. Curiosamente, tal como muitas dessas histórias, também Wavetoon nos chega do Brasil. Mas Wavetoon é acima de tudo um lugar onde se condensam todos os mitos do surf. Wavetoon é um pedaço de terra com todas as ondas possíveis: beach-breaks, reefs, point-breaks, outer-reefs. As imagens que nos chegam mostram-nas sempre a quebrar perfeitas – “a natureza foi generosa conosco e nos deu uma costa repleta de picos alucinantes”. Acima de tudo, Wavetoon remete-nos para todos os mitos fundadores do surf e para as suas imagens mais fortes. Nas histórias que são contadas encontram-se todos os elementos da nossa mitologia: “a estrada de terra pouco explorada e a praia deserta simbolizando nossa gana por caminhos inéditos e desconhecidos, o carro que nos faz nómadas modernos, a prancha, nosso veículo para a transcendência, as ondas, nosso objectivo final, nosso mestre, (e os amigos), representando (...) a cumplicidade que resulta desses momentos”.A história de Wavetoon é a história do surf simplificada e com lugar geográfico indeterminado. Dos primórdios em que o surf era um rito, passando pela descoberta de novas ondas e o desafiar de novas fronteiras, pela revolução que ocorreu na praia na passagem dos anos sessenta para os setenta, até às ondas crowdeadas dos nossos dias, está lá tudo. Como estão também as histórias mitificadas, repletas de personagem do assombro, os tubarões e os piratas (“diz a lenda que a primeira prancha de surf que apareceu em Wavetoon, foi uma Alaia trazida por um pirata. É incrível, mas foi isso mesmo que aconteceu. Por volta de 1600”); os pioneiros, lendas do passado que primeiro desafiaram mares gigantes e também os verões perfeitos, que nos acompanham toda a vida. E, claro, os temas dominantes da nossa experiência: as viagens, o corpo exaurido depois de um longo dia de surf com os amigos e a elegância feminina no surf, mas, também, nas praias.Wavetoon é-nos revelada em tiras de BD de traços infantis. Mas o que poderia afastar um adulto daquele imaginário tem o efeito contrário. Serve para revelar a simplicidade dos nossos mitos, ao mesmo tempo que os torna claros e compreensíveis por todos. O meu filho tem gostado do livro, talvez de um modo diferente de mim, mas essa talvez seja a prova acabada da força do que nos une enquanto comunidade. Uma coisa é certo, como se lê neste primeiro livro, “pouca gente conhece Wavetoon, mas posso garantir que é um lugar de sonho!". Um pouco como o surf, um mundo cheio de “nadas” que são, para nós, “tudo”.
Por Pedro Adão e Silva
publicado na coluna "Sal na Terra" da revista SurfPortugal.
colado do blog ONDAS.

2 comentários:

Surf4ever disse...

Muito legal o texto, eu tinha visto lá no Ondas.
Parabéns aí George e Tora, um ótimo Natal e final de ano, e um 2009 de muitas realizações!
Abração,
Gustavo

Anônimo disse...

consegui... passei na ativar e comprei o livro... garantido meu presente para minha amiga secreta... valeu... boas festas e muito surf... abraço...